domingo, 22 de agosto de 2010

Existe Síndrome Metabólica? Nova análise do estudo INTERHEART contraria esse conceito.

 

O conceito de síndrome metabólica (SM) tem sido adotado desde  a sua descrição por  Reaven em 1988 como uma entidade nosológica que inclui obesidade abdominal, dislipidemia, hipertensão e hiperglicemia.  Essa associação de fatores, cujo elo seria etiológico seria a resistência à insulina, está comprovadamente relacionada à maior incidência de doença cardiovascular. Entretanto, ainda não está estabelecido se a presença de síndrome metabólica agrega risco, ou seja, se é superior enquanto preditora de doença cardiovascular quando comparada à presença dos fatores de risco cardiovasculares isoladamente, ou mesmo a somatória deles.
Essa questão vem ganhando espaço nos últimos anos. A discrepância entre os critérios diagnósticos, que implicam em diferentes prevalências da SM dependendo da definição considerada  e a exclusão de fatores de risco  como o tabagismo e LDL elevados são alguns dos pontos passíveis de críticas.  Outras dúvidas pertinentes são relativas à validade de considerar o diabetes mellitus tipo 2 como parte da síndrome  e o quanto o tratamento da SM deva ser diferente do tratamento de seus componentes isoladamente. Essa última dúvida tem relevância na medida em que, uma vez estabelecida como doença, medicações indicadas para o tratamento específico da síndrome, e não apenas dos fatores de risco, podem ser desenvolvidas.
Nesse contexto, e na tentativa de clarear alguns desses pontos,  foi publicada em maio no Journal of the American College of Cardiology uma análise do estudo INTERHEART. Esse estudo  avaliou em 52 países dos cinco continentes 12.297 casos de infarto agudo do miocárdio, comparados a 14.606 controles, pareados por idade e gênero. Os participantes foram avaliados para fatores de risco cardiovascular, medidas antropométricas, hábitos de vida e alguns marcadores séricos. O objetivo era comparar o risco de infarto conferido pelos fatores de risco individualmente ou em conjunto e o risco conferido pela presença de síndrome metabólica,  tanto segundo os critérios da Organização Mundial de Saúde (OMS) quanto segundo os critérios da  International Diabetes Federation (IDF).
Os resultados confirmaram que a presença de  SM, tanto pelos critérios da OMS quanto da IDF implica em maior risco cardiovascular. Entretanto, o risco determinado pela presença da SM não foi maior que o risco determinado pela presença de hipertensão, tampouco pelo diabetes mellitus tipo 2. O risco determinado pela SM foi maior que o determinado pelo HDL baixo e pela circunferência da cintura aumentada. Além disso, o estudo avaliou o impacto da combinação de alguns fatores de risco. A concomitância de diabetes e hipertensão, por exemplo, determinou risco de infarto comparável à presença dos quatro componentes da SM.
O estudo conclui que a presença de síndrome metabólica não é um determinante de risco cardiovascular maior que a soma dos seus componentes,  e defende que a SM seja apenas a descrição de vários fatores de risco comumente associados. Além disso, o estudo também questiona a validade dos critérios diagnósticos, uma vez que pacientes com dois componentes da síndrome já apresentam risco aumentado, apesar de não preencherem todos os critérios diagnósticos, além de outras considerações em relação aos diferentes valores considerados normais.
A análise desse estudo não tem poder decisivo sobre o valor do diagnóstico de síndrome metabólica. Mas, considerando que nos dias atuais o conceito de SM está tão difundido que geralmente falamos sobre ele sem questionar sua validade, um dos méritos do estudo, além de agregar informação a uma discussão que ainda carece de subsídios, é trazer novamente à tona uma questão que certamente ainda demorará a ser esclarecida.
Leia mais em:
Mente A. e cols. Metabolic Syndrome and Risk of Acute Myocardial Infarction.  A Case-Control Study of  26,903 Subjects from 52 Countries. J Am Coll Cardiol 55:2390, 2010.
Kahn R. e cols. The Metabolic Syndrome: Time for a Critical Appraisal. Joint statement from American Diabetes Association and the European Association for the Study of Diabetes. Diabetes Care 28: 2289, 2005.

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